
Eram nove e meia da noite. Com todo aquele pessoal em frente ao teatro, reunidos e comentando. E eu decepcionado porque minha opção sexual é mulher com buceta.
Quando estou chegando na esquina, ouço um tumulto. Um rapaz batia com os punhos fechados no capô de um Kadet preto, com violência, e gritava:
__ Sai daí seu vagabundo!!!
O carro com as lanternas ligadas e dando setas, tentando se movimentar. A namoradinha do rapaz, com sua voz aguda, deve ter pensado na falta que lhe faria aquele carro tão confortável. E aqueles programinhas longe das asas de seus pais.
__ Pelo amor de Deus, chamem a policia. Estão roubando o carro, o carro do meu namorado.
Não sei o que me deu? Não sei porque tomei uma atitude. Só eu, mesmo para uma coisa dessa. Sendo que tinha um grupo de rapazes próximo e muitos outros, que olhavam curiosos.
Lembrei que voltando na rua, na outra esquina tinha um posto policial, e desandei a correr, passando em frente ao teatro de novo. Nisto vem em sentido contrário ao meu, um rapaz com um cachorro branco. Passeando com um cachorro, aquela hora? 10:00 horas?
Só identifiquei o cachorro quando ele tentou me morder, me acompanhando na corrida por uns dois metros. Neste momento eu já estava me sentindo patético. Uma por estar correndo, e outra por ter de interagir com um cachorro.
O foco das atenções era todo meu, com todos os olhos que enxergavam um ser de carne e osso histérico, correndo. E aquele cachorro que não parava de latir. Já fui relatando o acontecido para o guarda que estava na porta. E com a respiração ofegante e gaguejando, ainda mencionei a possibilidade de dar em merda, porque o ladrão estava dentro do carro e o dono cercando o carro.
Voltando, chego na esquina e o Kadet não estava mais lá. Fiquei desorientado. O rapaz me falou que o dono do carro achou que, aquele era o carro dele, sendo que o dele estava mais na frente.
__ Não é possível! Dois Kadet pretos?
E eu, o patético, parado na esquina. Sai totalmente fora do meu equilíbrio. Invejei aqueles que não se abalaram com o apelo da garota. Estava tudo calmo. As pessoas andando normalmente, as mesmas que identifiquei naquele momento febril. E o cachorro branco ia à frente, farejando o chão, ao lado de seu dono.
A gente sempre se esconde atrás de um equilíbrio. Não quer se expor. Faz tudo de forma calculada, com gestos medidos para não ser avaliado de forma negativa.Situações como estas, as neuroses urbanas, fazem com que as pessoas se tornem frias, com recusas expontâneas. Isto porque acontecem experiências das mais variadas situações. Como eu, que da próxima vez, talvez, seja apenas um curioso cauteloso. Cauteloso porque têm muitas balas perdidas voando por ai.
Um textinho de 8 anos atrás. Foi no Largo da Ordem e o teatro é o Londrina dentro do Memorial.
carlos jansson